terça-feira, 14 de agosto de 2012

Mau cafetão


Ramon era um garoto ingênuo, tímido. Talvez sua falta de atributos físicos o fizesse sentir-se menosprezado. Quando colocado perto de alguma garota, logo calava-se, não dizia uma palavra, como se o que fosse dizer tivesse o potencial de ofender a garotas presente. Ainda que estivesse a fim de uma garota, e por mais que tentasse, na presença feminina suas cordas vocais entravam em greve, até conseguia abrir a boca, mas as palavras teimavam em não sair de lá. Ramon já contava com 18 anos e havia beijado apenas uma meia dúzia de garotas, um pecado nefando para o juízo de sua idade. – “A quantidade de mulheres que beijei não define quem sou!” – repetia Ramon incansavelmente para si mesmo, numa tentativa de consolar seu ego ferido.

Se beijar garotas era um problema para Ramon, sua ainda intacta virgindade era o grande problema de sua vida, a questão a ser resolvida. Inegável que um garoto com 18 anos fique frustrado e decepcionado por ainda não ter provado daquilo que seus colegas gabam-se o tempo todo, como se fosse a conquista mais importante de suas vidas. A fim de manter uma vida social para, possivelmente, conhecer uma garota que topasse ser sua primeira mulher, a primeira a revelar a nudez, Ramon participava de encontros com colegas. Seu incômodo era quando o assunto sexo entrava na pauta. Ouvia, numa mistura de aluno ouvinte com o desprezo de um virgem frustrado, os amigos gabarem-se:

– Ontem levei a fulana para casa!
– Finalizou? – Outro colega perguntava.
– Evidente, rapaz! Comigo não têm essa enrolação! Ou vai para cama comigo, ou tchau! Não pago de namoradinho de rapariga nenhuma!

E, na cabeça de Ramon o dilema começa outra vez: – “Como pode ser tão fácil para eles e tão difícil para mim? Ou eu sou muito feio e mal educado, ou esses caras são demais!” – martirizava-se.

Pouco tempo depois, conheceu, na faculdade, um novo colega, seu nome era Tício. Este era um rapaz educado, de bom papo, simpático, e Ramon, inevitavelmente, estreitou as relações com Tício. Num dia qualquer, Ramon e Tício decidem matar aula e ir ao bar em frente à faculdade. Lá pela sexta garrafa de coragem, digo, de cerveja, Ramon dispara:

– Sabe, Tício, qual é minha maior frustração? – Pergunta com ênfase e, antes do amigo responder, lhe adianta, batendo no peito – Sou virgem! Isso mesmo, ouviu? Sou virgem!
–Ora! – Tício espanta-se – E porque?
– Como assim porque? Sou virgem por um simples motivo: Nenhuma mulher quer se deitar comigo!
– Não acredito nisso. Nos tempos em que vivemos não há mais virgens.
– Pois, então, sou o último!
– Mas como pode? Você é tímido?
– Tímido?! Tímido é pouco! Acho que, na verdade, só estou te falando isso porque o álcool me deu coragem!
– Ora, mas isso é fácil de resolver!
– Fácil nada! Já tentei de tudo. Passei semanas na internet pesquisando maneiras de acabar com essa timidez e não encontrei nada!
– Pois você não precisa de internet, meu amigo, você precisa de mim! – gabou-se.
– E como você vai poder me ajudar?
– Não se preocupe.
Ramon para um pouco e, com o ar questionador que a cerveja fornece, brada: – Olha, rapaz, lhe meto a mão na cara! Eu não sou gay, não, entendeu??
Tício dá uma gargalhada e responde: – Sua besta! Eu também não sou! Vou mexer uns pauzinhos e conseguir uma garota bem ajeitada para você. Espere alguns dias e te aviso.

E, de fato, Tício tratou de encontrar uma mulher para fazer a alegria do recente colega. Tício, apesar da pouca idade, era um malandro na vida, esperto, maquiavélico, engenhoso. Conhecia Cássia, uma garota um tanto sem escrúpulos, que afirmava ter como lema “curtir a vida intensamente”. Cássia era uma bela moça, devia ter seus 23 anos, e dona de um corpo que, por onde passava, despertava os desejos mais primitivos nos homens. Tício liga para Cássia e começa a contar de seu colega. Tício era uma espécie de psicólogo por vocação, pois conhecia a pisque humana como ninguém, e, por isto mesmo, conseguiu despertar em Cássia a vontade de ser a primeira na vida de Ramon. Plano arquitetado, na sala de aula chama Ramon de canto e diz:

– Consegui a mulher pra tu!
– Cara, vou morrer de vergonha. Não sei o que fazer!
– Olha, não tem com o que se preocupar. Eu já falei com ela e contei da sua timidez. Para falar a verdade, ela até achou “bonitinho” você ser tão tímido.
– Já estou tremendo!
– Toma jeito, rapaz! Mas têm uma coisa...
– O que é? – quis saber Ranon
– Ela cobra.
– Uma puta?
– Dobre a língua, Ramon, dobre a língua! Ela faz isso por necessidade. Paga os próprios estudos e precisa de um dinheiro extra.
– Complicado.
– Complicado nada. Escuta: ela é honestíssima e quase ninguém sabe que ela faz isso, sou um dos únicos.
– Mas como ela é? – questiona Ramon, já possuído pelo desejo
– Uma graça, uma querida!
– Está bem, eu topo! Quanto vai ser?
– Cem reais.
– Nossa! Tanto assim? Mas vale essa grana mesmo?
– Se vale? Eu até acho que ela deveria cobrar mais.
– Ok, ok.
– Mas é o seguinte: ela se sente ofendida com o dinheiro. Por isto, em hipótese alguma fale de dinheiro com ela, entendeu? Em hipótese alguma!
– E como eu vou pagar sem falar em dinheiro? Dou a grana mudo?
– Não. Você me entrega e eu deposito o dinheiro na conta dela. Entendido? Nada de falar de dinheiro.
– Perfeitamente!

Ramon vai para casa possuído pelo desejo. Antes de dormir, pensa em Cássia, que ainda nem conhecia. Espera, ansiosamente, a data marcada. Quando chega o dia, Ramon toma um banho digno de um Rajá. Depila-se, ensaboa-se, faz tudo conforme o protocolo. Na hora combinada Ramon aparece no apartamento de Cássia e, com as mãos trêmulas e quase caindo das próprias pernas, toca a campainha. Cássia abre a porta e Ramon rende-se ao óbvio: ela realmente era bonita, uma graça. O rapaz a encontra com uma camisola de dormir, quase diáfana, revelando-lhe a silhueta. O rapaz entra. Ramon sai depois de cerca de 2 horas. Assim que fecha a porta, um sorriso vadio, mas alegre inunda sua face. Está alegre como jamais estivera. Era, de fato, um homem feito. Dá pulos, socos no ar. Para em frente do espelho do elevador e diz, olhando a própria imagem: – “Você é O Cara, Ramon, você!” – e ri como se não houvesse amanhã.

Na faculdade, Tício vai ao encontro de Ramon e pergunta, à queima roupa:

– E então, o que achou da Cássia?
– Uma leoa na cama, se é que me entende. – Ramon responde ainda extasiado com a experiência.
– Eu lhe disse, amigo, eu lhe disse! – afirma Tício, enquanto dá três tapinhas nas costas do colega. – Mas e a grana, trouxe?
– Sim, trouxe. Tome.
– Perfeito. Preciso depositar para ela ainda hoje. Tchau!

A mente de Ramon estava tomada pela luxúria. Pensava em Cássia o tempo todo. Às vezes Ramon julgava ter voltado ao estado primitivo, onde apenas a satisfação dos seus desejos importava. Numa tarde de sábado, desesperado para satisfazer os próprios desejos, telefona para Tício, querendo que ele agende outro encontro com Cássia. Queria ligar diretamente para ela, mas o colega também o advertiu para que não pedisse o número do celular da moça, pois ela se sentiria ofendida, como se Ramon a visse como posse. Tício não atende na primeira tentativa, o que faz Ramon ficar ainda mais ansioso. Na terceira tentativa Tício atende e Ramon é enfático:

– Quero outro encontro com a fulana!
– Mas você vai ter que pagar de novo, Ramon. – Tício pondera
– Não interessa. Dinheiro há! Quero e quero hoje!
– Vai ser complicado conseguir assim, do nada.
– Pois, se conseguir, te dou um trocado!
– Vou ver o que consigo fazer.

Vinte minutos depois o celular de Ramon toca, mas Ramon apenas ouve, sem conseguir encontrar o aparelho. Num ato desesperado, derruba tudo que encontra pela frente para encontrar o celular e, com a sorte de dois segundos, atende:

– Conseguiu??
– Não foi fácil, mas deu certo.
– Isso! Isso!
– Vá ao apartamento dela às 20 horas, nem mais, nem menos, entendido?
– Perfeitamente! Muito obrigado!
– Escuta: Nada de falar de dinheiro ou pedir o telefone, certo?
– Certíssimo! Amanhã lhe dou a grana. – e Ramon desliga o celular.

Ramon olha o relógio e faltam 40 minutos para o encontro. Como um raio, enfiasse no banheiro e começa seu banho de Rajá. Canta, dá risada, dá pulinhos, enquanto toma banho. Por sorte, o apartamento de Cássia não era distante da casa de Ramon. Pontualmente às 20 horas ele toca a campainha do apartamento de Cássia e a cena se repete: camisola diáfana, sorriso bobo, e luxúria. Após o coito, Ramon está deitado na cama, junto de Cássia e sente algo estranho no peito. –  “Apesar de tudo, gosto desta garota! Queria ela pra mim.” – pensou Ramon.

Ramon teve mais cinco ou seis encontros com Cássia, todos agendados por Tício. Numa das vezes Tício tentou aconselhar o colega: – “Cuidado para não se apaixonar, rapaz!”. E na última vez que agendou o encontro, concluiu: – “Esse já era. Tomou o chá.”. E, realmente, Ramon estava apaixonado pela moça. Queria um contato maior com a amada. Num dos encontros, Cássia deixa escapar que também está gostando do rapaz. Ramon, que com Cássia já não era mais tímido, propõe, maravilhado:

– Pois fiquemos juntos, é óbvio!
– Será, meu docinho?
– Não há mistério, minha linda. Olha, sei que você não gosta que toque no assunto, mas...
– Que assunto? Pode falar, não têm problema.
– Ok, até porque você já sabe. Então, é até bom que fiquemos juntos. Meu dinheiro está acabando. – Ramon confessa, meio encabulado.
– Como assim “meu dinheiro está acabando”? – Cássia pergunta, sem entender nada.
– O dinheiro que dou ao Tício e que ele deposita em sua conta.
– Você deve estar doido de amor, Ramon. Eu não recebo dinheiro de ninguém, muito menos de Tício, ora bolas. – Cássia diz, enquanto faz carinhos em Ramon, que parecia sério, pensante.

No sábado Ramon vai até a casa de Tício e o chama pelo celular. Diz que precisa dizer algo ao colega, mas pede que ele leve a carteira até o portão. Sem estranhar, Tício faz o que o colega pede. Assim que Tício abre o portão, Ramon saca um revólver e vara o colega com 4 fatais tiros. Enquanto o colega de faculdade ainda agoniza no chão, Ramon pega a carteira e retira as cédulas que lá estavam, cerca de quatrocentos reais. Guarda o dinheiro no bolso e sai em direção ao encontro com Cássia.

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