domingo, 25 de março de 2012

O homem sem lágrimas

Desde criança – contava Arthur – aprendera a ignorar qualquer emoção. Era um homem sem sentimentos, nada o abalava. Não era para menos, cresceu numa família precária, onde viu de tudo: Irmãos drogados, tio pederasta, primos ladrões, o pai, que outrora foi um homem de virtudes inabaláveis, enlouqueceu e vivia na varanda de casa, eternamente, como se esperasse alguém. Quiçá o mais normal de sua família, Arthur aprendeu a ver e não sentir; a sentir e reprimir; a reprimir e esquecer.

Não parece possível e viável um ser humano sem sentimentos, ser nossa razão de ser. Mas a vida conseguiu criar um. Certa vez, Arthur contava para seu único e, talvez o único possível amigo, sobre a ocasião que decidiu amar. Tentou amar mulheres, familiares e, até, um amigo canino. Os familiares eram como estranhos. Havia mais intimidade com o mendigo da rua do que com a mãe ou os irmãos.  Não se ama alguém sem intimidade; Mas encontrara uma bela pequena, dessas que se ama só de passar os olhos. E Arthur por ela se encantou. Tratou de conhecer a moça e fazer uma espécie de pesquisa sobre a vida da pequena. Boa índole, concluiu Arthur. Decidiu namorar e, mais importante, decidiu amar a moça.

Não é possível negar que realmente estava feliz, sentia-se feliz. A namorada de Arthur não era um exemplo de namorada, mas o fazia feliz, o que, para ele, já era o suficiente. Pela primeira vez sentia felicidade, concluiu Arthur. Com seis meses de namoro, a paixão do rapaz havia se tornado amor e a pequena dizia-lhe o mesmo.

Dois meses após a paixão tornar-se amor, Arthur estava voltando para casa depois de um exaustivo dia de trabalho, daqueles que você imagina ter trabalhado uma semana ininterrupta, e decide passar pelo bar de um colega para tomar uma cerveja e assistir o restante do jogo de futebol. Depois do dia trabalho que parecia uma semana, Arthur se achava digno de uma cerveja com futebol, e tinha a certeza de que sua namorada compreenderia o atraso. Cerveja tomada, jogo assistido, hora de voltar para casa.

Na volta, faz um caminho diferente, um pouco mais longo, para passar pelo parque e admirar o efeito que a lua cheia pode dar a qualquer lugar. Caminhava silencioso quando algo lhe chamou a atenção. Não acreditava naquilo que seus olhos lhe mostravam. Viu sua namorada sentada num banco com outro. Outro rapaz, daquele estilo conquistador barato, com roupas que não estavam quitadas e que, talvez, nunca seriam. Arthur estaca no chão e sente vontade de chorar, gritar, bater, vontade de matar. Mas apenas respira fundo e vai para casa da namorada. Dentro da casa, escreve um bilhete e o deixa em cima da escrivaninha. Foi o que conseguiu fazer.

Uma semana depois do triste evento, Arthur está no trabalho quando é chamado à sala do chefe. Entra de maneira educada, como sempre fizera. Na sala, o boss começa a explicar a Arthur que a empresa passa por um momento de dificuldades e que precisará fazer cortes no quadro de empregados. Infelizmente, Arthur é um dos cortados da empresa.  Eram sete horas da noite e Arthur decide ir ao bar beber, afinal, nada sentira com a demissão.

Um pouco embriagado, Arthur volta para casa. Ao chegar, vê na caixa de correio algumas contas. Apanha as contas e vai para o quarto. Rapidamente, analisa as contas e deita-se na cama. Mais relaxado, Arthur começa a lembrar de toda vida que viveu, e a que deixou de viver. Lembrou-se do seu lar destruído, dos amigos que lhe traíram, lembrou-se que não confiava mais nas pessoas, da namorada, a mulher que amou, e que lhe traiu, recordou-se do emprego perdido e das contas para pagar; que já não possuía motivos para viver e que, talvez, nunca havia possuído.

Calmo, Arthur levantou, foi até o guarda roupas e, no fundo de uma gaveta, pegou seu revólver. Municiou o 38 e sentou-se na cama. Com o revólver carregado, Arthur o coloca na boca e mais uma vez lembra-se de tudo que viveu. Puxa o cão do revólver e... Rompe-se em lágrimas, cai num pranto que parecia eterno. Continua a chorar como se fosse uma criança. Chora como se não houvesse mais amanhã. Com tanto choro, Arthur se cansa e adormece sem perceber.

Ao acordar, Arthur sentiu como se tantos anos sem sentimentos, tantos anos sem lágrimas, o tivessem feito carregar um pesado fardo. Levantou da cama, abriu a janela e viu um dia razoavelmente bonito. Respirou fundo e disse para si mesmo: - Estou pronto para recomeçar.

quarta-feira, 21 de março de 2012

O tempo dos cretinos

Não é difícil encontrar alguns inimigos, qualquer pessoa os têm. Não importa que tipo de inimigo seja: A comida, as pessoas, os livros, ou a simples vida. Até Jesus Cristo os teve, porque você, meu caro leitor, não haveria de tê-los? Confesso que os meus são vários, e de todas as ordens. Ora são coisas ou pessoas agradáveis, ora, subitamente, sem aviso prévio, tornam-se arqui-inimigas dos mais cruéis, daqueles que te fazem perder noites de sono. O motivo de tão drástica mudança, às vezes, tona-se um mistério. Contudo, não raras vezes, somos a fonte de tal mudança. Diria até, que, para nossa evolução, se faz necessário que algumas das coisas ou pessoas agradáveis tornem-se nossas arqui-inimigas.

Ao longo de minha curta e, por vezes, pacata vida, fui colecionando meus próprios arquiinimigos. Não vou perder tempo elencando cada um deles. Seria um esforço desnecessário e inútil, pois minha memória é algo incrível: Lembra-se de tudo que eu não preciso saber, mas, aquilo que realmente me interessa, ela faz questão de atirar à lata de lixo da memória. Acredito que coisas valiosas, como datas de aniversários, recados, matérias de prova e mais, estejam perdidas neste sinistro lugar.

Mas onde é que eu estava? Os meus inimigos, é verdade. Creio que nenhum deles tenha se tornado tão arqui-inimigo meu quanto o Sr. Tempo. Sim, este que ao mesmo tempo, me parece o tudo e o nada, o palpável e o intangível. O que seria o tempo senão algo criado para nos atrapalhar? Engraçado. Todos estão condenados ao tempo, humilhados pelo tempo, menosprezados pelo tempo, e, mesmo assim, ninguém consegue encontra-lo. Ou você nunca notou a expressão mais utilizada por nós: “Não tenho tempo”? É um paradoxo: Estar rodeado pelo tempo e, ao mesmo tempo, não ter tempo. Imagino que seja algo parecido com estar rodeado de dinheiro, podre de rico, e não conseguir usar bem um único segundo, digo, um único centavo.

Então, a fonte do problema seríamos nós mesmos? Acredite, sempre foi. Como a má administração do SEU tempo pode ser culpa de outra pessoa? Parece-me um sintoma do Complexo de Homer Simpson, onde este afirma categoricamente: “A culpa é minha e eu boto em quem eu quiser!” Óbvio que a culpa é exclusiva do indivíduo que está sem tempo, mas vamos aos coautores e partícipes: A sociedade, a cada dia, inova nas funções que as pessoas devem exercer. Sufoca-nos com novas atividades, com novas responsabilidades e nos esmaga com um dia de 24 horas. Desta maneira, ficamos limitados para fazer aquilo que realmente nos interessa e nos dá prazer.

Sinceramente? Nem eu acredito na explicação que dei. Sociedade é algo abstrato, intangível, que só existe no imaginário dos grandes intelectuais esquerdistas que estão preocupados em achar alguém ou alguma coisa para outorgar a própria culpa ou a culpa de alguém que, segundo o martelo da razão esquerdista, não teve chance. E não há nada melhor para por a culpa do que a querida sociedade.

Mas voltemos ao Sr. Tempo. Admito ser um homem sem tempo. E minha amiga consciência permite que eu outorgue a culpa apenas em mim. Infelizmente, não posso culpar você, leitor, por eu estar sem tempo. Seria mais cômodo e agradável, admito. Gostaria de oferecer minhas escusas a Marco Aurélio de A. dos Santos, afinal, sou a fonte de sua falta de tempo. Que lugar melhor seria o mundo se cada um admitisse sua culpa. A justiça seria célere novamente (se é que já foi. Eu não me lembro). Sendo o culpado por minha falta de tempo, resta-me apenas tentar corrigir meu tempo, precioso e mal administrado tempo. E é o que venho tentando fazer. Posso estar demorando, mas empiricamente, estou aprendendo a domar o leão indomável que atende por Tempo.

Ao mesmo tempo em que aprendo a domá-lo, aprendo a desprezar aqueles que desperdiçam, em tempo integral, seu próprio tempo. Os desperdiçadores de tempo de hoje, são os mamadores da suculenta e irresistível teta estatal de amanhã. Os brasileiros estão contaminados com o vírus Perda de Tempo. Nosso país sofre da epidemia Perda de Tempo. Os sintomas são aparentes e a doença é degenerativa, primando por eliminar toda e qualquer atividade cerebral.

Meu desprezo pelos moribundos do vírus Perda de Tempo não é mero preconceito. É fruto de longa reflexão e estudo de caso. E, durante a madrugada que escrevo a presente reflexão, o desprezo aumentou consideravelmente. O relógio bate 4 vezes, o que indica quatro horas da madrugada. Iniciei meus trabalhos acadêmicos às 22h30min e os conclui algo perto das 03h00min da madrugada, o restante do tempo dediquei para escrever a presente. Enquanto utilizava a internet para acessar a matéria necessária para realizar o trabalho, via ociosos que jogavam seu tempo pela janela. Homem de insônias terríveis e sonos breves, sinto um desprezo maior ao ver o sujeito desperdiçar o tempo que poderia utilizar para realizar a única atividade inocente do ser humano, aquela que até o homicida se tona puro: A arte de dormir. Já perdi a conta de quantas vezes topei com um desgraçado que poderia estar dormindo e lhe perguntei: “Que diabos está fazendo que não está dormindo, infeliz?”

Outro desperdiço de tempo que aprendi a odiar é o desperdiço de tempo para os estudos. No alto de minha adolescência, fui um típico jovem e não dava pelota para estudos. Mas, assim como o Ronaldo aprendeu a amar o Corinthians, eu aprendi amar os estudos, amar a leitura e, contrariando meu espírito de brasileiro, me apaixonei pelo conhecimento. Não posso deixar passar o desperdício de tempo para o trabalho, esta atividade que dignifica a alma do homem. Vá à rua, durante a semana, entre as 16 horas e as 19 horas. Você verá Perdedores de Tempo fazendo o que são treinados para fazer: Perder tempo. Deveriam estar trabalhando, rendendo, ganhando dinheiro e dignidade, mas preferem perder tempo com atividades inúteis.

Gostaria fazer um apelo a você, cretino que deixa o preciso tempo escapar e que, mais tarde, irá dizer que a culpa pelo seu fracasso é da sociedade, consequentemente, mamando na saborosa teta estatal: Tenha tempo! 

domingo, 18 de março de 2012

O homem sem amor


Aílton era o tipo conquistador, daqueles de cinema, dos contos. Na cidade onde morava, que não era grande nem pequena, as mulheres, casadas ou não, o conheciam e, mais cedo ou mais tarde, pegavam-se pensando em Aílton. Este nunca foi um homem de virtudes inabaláveis, de um senso moral aguçado. Saia com qualquer tipo de mulher, casadas ou não. Não há diferença entre elas – dizia ele – todas procuram o pecado!

Quando ainda era um garoto, ouvia as conversas dos mais velhos, cretinos mais velhos. Um ensinamento que Aílton aprendeu com as conversas, e que pôs em prática a vida toda, foi o de que o homem só era homem se tivesse várias mulheres. Não uma, ou duas, mas várias. Cresceu assim, com várias mulheres. Inegavelmente, se tornou um Doutor em Infidelidade; era o melhor. Conseguia sair com três ou quatro mulheres por semana sem que uma jamais desconfiasse da existência da outra. Em certa ocasião, enquanto bebia no bar com um amigo, disse:

– Comigo é assim mesmo, entendeu? Dou à mulher aquilo que ela deseja, aquilo que deseja! Ou você acha que procuram outra coisa? O pecado, sim! É o pecado que desejam!
– E você, o que deseja? – Perguntou o amigo.
– Quero apenas me divertir – respondeu Aílton
– Ainda vai se cansar dessa vida. Homem nenhum aguenta. Nem o mais cafajeste dos homens! – O amigo aconselhou.
– Me cansar? Hora essa! Supomos que eu me canse. Vou fazer o que? Casar-me? E a troco de que? Casaria se meu desejo fosse ser traído! – Exclamou  Aílton .
– Nem todas são assim, e garanto! Minha esposa é uma santa! Um exemplo de mulher! – Disse o amigo.
– Conversa! Depois de tudo que vivi e de tudo que sei, não confio em mulher nenhuma. Não confiaria na sua, se fosse casado com ela. – Respondeu  Aílton , com uma mistura de melíflua e tristeza.
– Canalha! Há de morrer só! Ouviste? Só! – Praguejou o amigo, que se retirou do bar.

Aílton continuou a beber sozinho, sentado na mesa de bar como se esperasse eternamente alguém lhe acompanhar, um alguém que nunca chegaria. Era como se as simples palavras do amigo tivessem trincado a armadura de infidelidade que  Aílton  vestiu.

Porém apenas aparentava, pois  Aílton  continuou com sua vida mundana, dando pecado às pecadoras, como ele mesmo gostava de definir. Não era raro a cena se repetir:  Aílton  fisgava um moça, que na maioria das vezes era uma bela moça. Com sua conversa – diga-se de passagem, era um dos poucos homens que sabia conversar com uma mulher – ele conseguia despertar na moça um desejo, o desejo do pecado. E conquistava mais uma.

Colocando em prática as lições que aprendeu, ao final do primeiro beijo levava a pequena para sua casa. Além de mestre com as palavras, era exímio na cama. Levava mulheres ao delírio. Seu quarto era uma espécie de volúpia em quatro paredes; a luxúria se instalara no quarto. Era um mestre que repudiava seu talento. Quantas e quantas vezes, depois de satisfazer a vontade de uma pequena, pensava:

 – É como todas as outras. Não passa de uma vagabunda. Mal a conheço e está aqui, nua ao meu lado. Não sei de onde vem, mas de sua nudez sou íntimo.

Quando já estava velho,  Aílton  se pega pensando em tudo que viveu, nas pequenas que teve, nos decotes que beijou, pensava nos casamentos que terminaram por causa de seu charme, lembrava-se de tantas mulheres que o amaram, de tantas que o desejaram; E enxergou que, na verdade, não queria apenas se divertir, como havia dito ao amigo.  Aílton  desejava uma mulher para amar, uma mulher para acariciar, uma mulher para olhar nos olhos dela e sentir-se feliz por ter ao seu lado alguém que lhe respeitava, que lhe amava. Infelizmente, encontrou apenas pecadoras. Após a recordação,  Aílton  teve a iluminação da verdade e admitiu para si mesmo ter sido um homem que não conheceu o amor. Admitiu ter vivido como um homem que apenas fez amor.

Meses depois  Aílton  morreu. O melhor epitáfio para o homem sem amor seria: “Aqui jaz  Aílton, o paradoxo: Rodeado de mulheres que o desejaram e sem nenhuma para chorar sua morte”.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Um apelo às mulheres

Lembro-me – na verdade, finjo que lembro – de quando as mulheres se comportavam apenas como mulheres. Estas tinham modos delicados e afeminados. Até um espirro era elegante. O homem que recebia de uma mulher um tapa na cara sentia-se humilhado. Era o mesmo que ser surrado por um anjo.

Recordo-me de uma cena que me contaram. Certa vez, uma mulher estava na sala de casa, com visitas, enquanto o marido, um verdadeiro erudito, mostrava a coleção de selos aos amigos. Evidente que a donzela em tela não participava da exibição de selos. Ela estava sentada com as demais mulheres, conversando coisas de mulheres, e todas se portavam como mulheres. No meio da conversa, uma das presentes faz um comentário hilário e apenas hilário. Porém, a Dona da Casa não consegue se controlar e solta uma gargalhada típica de vizinha gorda. Ao fim da gargalhada, a donzela foi tomada por escrúpulos femininos e correu para o quarto, onde trancou-se por vergonha do ato ignóbil. Afinal, gargalhada era coisa de mulher falada, dizia o locutor. Todas as mulheres poderiam ter uma pouco da Senhora da Gargalhada dentro de si.

É com tristeza que sinto saudades por não ver um vestido de florzinha caminhando junto a unhas à francesinha. Onde estarão as mulheres que falam palavrão apenas em pensamento e num momento de cólera mortal? Não é por acaso que fico encantado ao ver uma “mulher feminina”, aquela que preza pelos cabelos bem cuidados, usa roupas que valorizam sua feminilidade e possuem o olhar da mulher.

Ficar encantado é o mínimo, afinal, o que me cerca é lamentável. No mínimo, lamentável. Sinto um grande tédio visual por ver mulheres com botas e fivela que até o mais puro sertanejo do rural acharia ridículo. Botas sujas, mas sujas de andar na cidade, ou, no máximo, carregam a poeira de um show “sertanejo universitário”. Afinal, elas fazem parte da categoria cowboys e cowgirls da cidade. Esse tipo de mulher, se é que posso chama-las assim, não usam camisas ou camisetas que valorizem sua silhueta de mulher, que as diferenciam da sombra de um homem. Devo ser sincero e admitir que todos usam esse tipo de roupa, mas usam em festas juninas.

Oh, grande Nelson Rodrigues, tu estavas certo ao afirmar: “As feministas querem reduzir as mulheres a um macho mal-acabado”. Elas conseguiram! Transformaram as mulheres dessa região em machos mal-acabados. Querem andar como homens, vestir-se como homens, falar como homens. Acredito que elas se dão conta de sua essência feminina apenas e unicamente quando estão nuas de frente para o espelho; isso se não arrotarem.

Antes de finalizar, deixo o apelo deste que vos escreve, um homem que sente falta das mulheres femininas: Sejam mulheres, mulheres de verdade, mulheres em essência; apenas mulheres, por favor!

Apaixonada pelos estupradores

Mirante do Paranapanema, minha terra natal. Uma pacata cidade do interior paulista, pertinho da divisa com o Paraná. Sempre foi muito tranquila e receptiva. Moro em Mirante desde que nasci, ou seja, há 19 anos. Sou um mirantense nato e hereditário.

Fundada em 1953, no ano de 2010 comemorou 57 anos. Participei das comemorações. Pela cidade toda espalharam faixas com os dizeres do tipo “Parabéns pelo seu progresso”. Parabéns pelo seu progresso, vá lá. A história de Mirante começa por volta de 1918, com a chegada de Labieno da Costa Machado. Sua figura ficou conhecida no popular mirantense como sendo aquele que matava caso você não vendesse suas terras para ele. Mito ou não, não sei ao certo. Mas foi Labieno que deu início a Mirante. Engraçado, a cidade começou a ser formada onde, hoje, é um distrito. O distrito de Costa Machado. (Percebe-se que Labieno foi bem influente). A futura cidade foi crescendo no próprio distrito. Mas, por volta de 1946, os irmãos Okubos decidem lotear muitos alqueires de terra que haviam adquirido. Nascia, assim, a cidade de Mirante do Paranapanema (hoje há o busto de um dos irmãos Okubos na Praça da Igreja, como é conhecida por aqui).

Algo que sempre gostei, é de ouvir as histórias dos velhos que estão aqui há muito, muito tempo. Os relatos são sempre os mesmos: Mirante crescia assustadoramente no início de sua história. Aos domingo, como a movimentação de pessoas era muito grande, diziam que a cidade virava um formigueiro. Alguns dizem, ainda, que mal dava para andar de automóvel pela Rua Alberto Shiguero Tanabe, tamanho era o movimento de pessoas e animais. Realmente, tinha tudo para crescer e se tornar, como enuncia a todo pulmão em seu hino, uma Nova Capital. Era conhecida como a Capital do Pontal (algumas administrações, como forma de piada para alegrar o dia dos mirantenses, ainda conservam esse título nos carros oficiais). Foi uma das primeiras cidades da região a instalar Comarca. A extensão territorial é uma das maiores do estado. Possui dois distritos. O progresso era evidente, ululante.

Os japoneses que para cá vieram se assustaram com tamanho progresso, com tanta terra para trabalhar! A Terra Mirantense é um dos trunfos da cidade. Mirante é um município rico em terras. No início de sua história produzia algodão como ninguém. A produção era tão grande que a cidade era chamada de Ouro Branco, e, como também está gravado no hino municipal, Rainha do Algodão. Quanta terra para trabalhar, meu Deus! Qualquer um podia crescer trabalhando nessa terra.

Mas a vida não é justa e seu maior trunfo deu vida à sua maior desgraça. Não a única, mas a maior. Todavia, voltemos às Terras Mirantenses. Qualquer trunfo gera inveja, cobiça. As Terras Mirantenses atraíram trabalhadores que estavam interessados em mudar de vida através do suor do próprio corpo. Mas atraiu, também, vagabundos que se aproveitam do trabalho alheio. Não me lembro da data exata, ou o ano aproximado, mas os Sem Terras para cá vieram. Começa o declínio do Império da Rainha do Algodão, da Riqueza da Nação, como diz o hino municipal.

Os mais velhos, sim, os mais velhos e mais sábios me garantem que os Sem-Terras não vieram sozinhos, trouxeram muito mais: Vadiagem, aumento de crimes e o declínio mirantense. Invadiram terras de trabalhadores, mataram o gado alheio, assaltaram caminhões, fizeram baderna. Transgressores da lei: não há definição melhor para o MST. Ao mesmo tempo em que o MST descobria o Pontal do Paranapanema, Mirante do Paranapanema deixava de crescer. Sua economia era baseada no campo. E, com a terra sendo estuprada por desocupados, a economia mirantense caiu. Caiu muito. Caiu tanto que até hoje não a vejo reerguer-se. (Com a instalação da Usina Conquista do Pontal, a coisa melhorou, mas não trouxe de volta à minha cidade a economia que espantava os japoneses. Mas agradeço por ter empregado centenas de desocupados).

Quando nasci, o MST já estava bem instalado e acomodado por essas bandas. Não tinham as regalias que possuem hoje, mas já estavam mamando na saborosa Teta Estatal. Com o governo Lula, o MST realmente se fortaleceu: Agora poderiam fazer financiamentos e não pagar nada, nada mesmo. Afirmo e trago testemunhas: Em certa ocasião, fui ao banco pagar algumas contas. Atrás de mim estavam três senhores, cada um sem, no mínimo, quatro dentes. A fila não anda e, súbito, me pego ouvindo a conversa dos senhores Sem-Terra e Sem-Dentes. Estavam felizes da vida, e não era para menos. Um deles dizia que o Lula afirmava que os Sem-Terra teriam até o fim de 2010 para quitar suas dívidas (acho estranho, afinal, Sem-Terra pagar os financiamentos?). Porém, se não pagassem, a dívida estaria perdoada. Minha vontade era de virar-me e dizer aos senhores Sem-Dentes: “Tomem vergonha nessas caras, vadios!”.

Sim. Mirante do Paranapanema foi estuprada pelo MST, pelo PT e por Lula. Um estupro triplo.

Concluo a parte histórica para contar-lhes um episódio ocorrido no dia 04 de dezembro. Estava eu na confraternização do fórum, quando nota-se que acabou o carvão e a carne. Fui o encarregado de buscar mais. Pego o carro da Sulamita e vou com o André Barreto até o açougue (que estava a três quilômetros, mais ou menos). Antes de chegar ao açougue, passo pela Praça da Igreja (aquela com o busto do irmão Okubo), e vejo algo incrível: Numa lanchonete está sentado um camarada vestindo uma camiseta com uma estrela enorme do PT e, como se não bastasse, um boné do MST. Vi ele dando um sorriso e lhe faltavam alguns dentes. Fui tomado pela ira. Dentro do carro eu dizia coisas que não podem ser escritas nesta crônica. Alguns metros adiante, vi um carro que exibia a cara de Dilma Rousseff. Só podia ser uma conspiração petista contra mim. O camarada da lanchonete, penso eu, queria dizer algo do tipo com a camiseta e o boné: “Moleque,  acabamos com sua cidade, estupramos ela, e vocês são gratos por isso.” Cheguei à conclusão que Mirante é apaixonada pelos seus estupradores.

sexta-feira, 2 de março de 2012

Até que a morte os separem

(Quebrando um pouco a rotina de postagem do meu blog, hoje posto um conto que escrevi em meados de novembro de 2011. Espero que gostem.)

Conheceram-se na faculdade, deviam ter seus 19 anos e estudavam junto. Entraram na universidade no mesmo ano, mas só deram conta da existência um do outro dois anos mais tarde, mesmo participando da mesma turma. Num trabalho de Direito Civil, se não estou enganado. Foi uma paixão daquelas que te fazem tremer em cima das próprias pernas, e, tanto Carlos quanto Angélica tinham a certeza de que haviam nascido um para o outro. Acreditavam que morreriam lado a lado, como num belo conto.

Realmente, estavam vivendo um conto de fadas dos mais maravilhosos, escrito a ouro. Carlos sempre adorou estudar, era um aluno dedicado e esforçado: Trabalhava de segunda a segunda para conseguir pagar as mensalidades e demais despesas universitárias, e para ter algum trocado para gastar com Angélica. Como a amada era da mesma sala, Carlos contava os minutos pra sair do trabalho, pegar um ônibus e viajar uma hora para, finalmente, chegar à faculdade e encontrar a mulher que amava.

Angélica, por sua vez, não precisava trabalhar para pagar os gastos universitários, afinal, seus pais pagavam tudo e, ainda, davam-lhe uma mesada para gastar da maneira que bem entendesse. Mas amava seu namorado. Via em Carlos algo mágico, só não sabia explicar o que era. A magia não repousava na beleza do rapaz – diga-se de passagem, que era um belo rapaz – talvez, fosse ver o namorado se esforçando tanto e com um objetivo no olhar.

Necessário contar o episódio do passeio no Parque do Ingá: Estavam no auge da paixão. Apenas o olhar de Angélica era suficiente para fazer Carlos sentir o coração pulsar como se fosse saltar pela boca. Trocaram juras de amor. Angélica sentia em Carlos uma espécie de porto-seguro, pois sabia que o namorado estaria sempre a seu lado, e sentia-se agradecida por isso. Quando pararam para admirar o lago, Calor disse:

– Meu amor, sabe que te amo verdadeiramente, não sabe?
– É claro – respondeu Angélica – Você é meu porto-seguro, coração!
– Quero que fiquemos juntos até o fim de nossas vidas. – Retrucou Carlos.
– Oh, querido! Eu também!
– Sabe, como os padres dizem: Até que a morte os separe!
– Até que a morte nos separe, meu amor! – Exclamou Angélica.

Mais três anos se passaram e ambos atingiram o grau de Bacharel em Direito, sem uma dependência e com rendimentos exemplares. Talvez, um fosse a energia que o outro necessitava, afinal, dizem que o segredo para o sucesso é fazer aquilo que se ama; fazendo com a pessoa amada, o resultado pode ser melhor ainda.

A teoria era verdadeira: Trabalhavam juntos e era apenas sucesso. Juntos, não havia causa impossível de ser ganha. Em três anos de trabalho, haviam juntado muito dinheiro e faziam sucesso como advogados.

Contava-se cinco anos desde que estavam juntos, desde o trabalho de Direito Civil. Carlos continuava a trabalhar muito, queria o melhor para seu ser amado. Contudo, não era idiota. Quando foi que tudo começara? Não tinha certeza, mas acreditava ter acontecido há um ano: Angélica não era mais a mesma. Alguma coisa havia mudado na mulher que Carlos sempre amou, sempre cuidou.

Ao chegar em casa, Carlos beijou a mulher, como sem sempre fazia. Mas o beijo da mulher era frio, não havia no beijo qualquer sinal do amor que os uniu. Na cama, a mulher já não desejava o homem que outrora amou e, quando Carlos a procurava, Angélica o evitava. Consternado, Carlos sentia que a própria mulher por ele tinha nojo;  ou que alguém já tivesse dado à Angélica o prazer que ele procurava. Preferia acreditar na primeira opção.

Foi naquele dia quente de novembro, depois de um dia cheio de trabalho e audiências, que Angélica deu-lhe o golpe mortal. Sentada à mesa de jantar, e com a calma de uma estátua, disse a Carlos:
– Quero me separar de você. Nosso amor já morreu e eu preciso viver a minha vida!

Angélica não disse, mas Carlos teve a certeza da infidelidade da mulher que sempre amou. Pela sua cabeça passou todos os planos que fizera para ambos e concluiu em pensamento: – “Não trabalhei tanto à toa. Tudo vai ser como planejamos quando estávamos apaixonados!”. – Ao passo que apenas respondeu para a mulher: – “Compreendo. Faça como bem entender”.

Satisfeita com a compreensão do pobre Carlos – maneira como ela denominava o homem que cuidou dela – Angélica foi deitar-se para, no dia seguinte, contar a Rodolfo que poderiam, finalmente, passar a viverem juntos. Estava feliz. Estava novamente apaixonada. Sentia-se viva.

Carlos entrou no quarto e viu o amor de sua vida dormir de maneira angelical. Pensou ver um sorriso levemente esboçado no canto da boca da mulher que um dia prometeu ficar ao seu lado até o fim da vida.

Taciturno, silencioso e com a calma de uma estátua, foi ao lado de Angélica e deu-lhe um beijo no rosto. Foi até o guarda-roupa e pegou seu revólver calibre 38. De pé, ao lado de Angélica, deu-lhe três tiros na face. Ainda com a calma de estátua, deitou-se ao lado de Angélica – que ainda parecia sorrir – e disse: – “Até que morte nos separe!”. – E deu um tiro na própria boca. Morreram lado a lado