quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Estado laico, humanos religiosos


A marginalização do pensamento e do conhecimento religioso, em especial o cristão, é fato corriqueiro, com ênfase maior nas universidades, centros de pesquisas e debates de toda a espécie. Seja qual for o tema, assim que um cristão dispara um argumento com o menor resquício de religiosidade ou menção à bíblia, é rechaçado, ignorado, menosprezado e humilhado de imediato. Mais de dois mil anos de estudos e desenvolvimento de uma doutrina são atirados à lata de lixo, como se de nada valessem.       E não importa qual o assunto em pauta.

Nas discussões que envolvam políticas e legislação, a coisa piora significativamente. Não é mais aceito justificativas morais que se sustentem, no mais mínimo que seja, na moral absorvida pelo brasileiro, que é a cristã. O cristão que têm fé na doutrina, que acredita nela, precisa travestir seus argumentos para que não aparentem ter um pingo de religiosidade. Não entendo o porquê de outros tipos de conhecimento obterem espaço nas discussões e o religioso não. Dirão que o conhecimento religioso é irracional, ilógico, sem fundamentação, mas, ironicamente, os que afirmam isso não param por um momento para analisar o que refutam de imediato.

Não falo por falar. Faço parte do mundo virtual e acompanho suas mutações. E, inegavelmente, o conhecimento de hoje é adquirido, em sua grande maioria, através da internet. Aqueles que se preocupam com um conhecimento com qualidade maior – seja qual for o tipo de conhecimento e a qual vertente ele pertença – ainda conseguem esquivar-se do conhecimento leviano e mal intencionado da internet. Criaram uma nova forma de absorção de conhecimento, que ocorre de diversas maneiras. Cito como exemplo o mais comum: acontece através do compartilhamento de imagens, com um pequeno texto, nas redes sócias, principalmente no facebook. Funciona da seguinte maneira: Um usuário qualquer utiliza a foto de uma criança que passa fome e, na mesma imagem, insere um texto parecido com “Deus dá carros e casas, mas não me dá comida.” e o usuário que recebe a imagem, instantaneamente, acredita compreender toda a complexidade dos desígnios de Deus, e passa a ser militante da causa ateísta. Outro exemplo: Pega-se a foto de um famoso rico e ateu junto de uma criança pobre e está pronta a prova de que os ateus são infinitamente mais caridosos do que aqueles que pautam-se pela doutrina da caridade. Esta técnica é utilizada para angariar adeptos para qualquer causa, qualquer uma, sem restrição.

Fiz uma breve introdução para mostrar o estado de coisas. Passemos ao assunto principal. Estado laico é a exigência do momento e não discordo dela. O Estado não pode e não deve ter religião. Religião é para o ser humano, não para um ente que existe apenas no mundo do teatro jurídico e político. O Estado não tem forma, não tem alma e não pode ter religião. Se o Estado fosse capaz de ter fé, poderia ter religião. A outra parte do contrato social, ou seres humanos, pelo contrário, possuem alma e têm todo o direito de ter fé.  Não apenas o direito de ter fé, mas, também, o direito – e eu diria “o dever” – de usar sua fé como parâmetro para discussões de qualquer espécie.

Um Estado laico não é sinônimo de um Estado ateu, caso fosse, não seria possível admirar o Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, as belíssimas igrejas espalhadas por todo território nacional. O Estado não pode fazer qualquer tipo de coisa a não ser através das pessoas. Como eu disse, o Estado é um teatro jurídico e político. Acompanhe: Quem celebra um acordo entre nações é a própria nação ou as pessoas que representam a nação? As pessoas, evidentemente (parece óbvio, mas o óbvio só é óbvio quando descobrimos sua obviedade). E as pessoas possuem seus próprios credos.

Um Estado laico não deve se meter em assuntos religiosos, ditar as regras de um culto ou de uma missa, de um batismo, ou de qualquer manifestação da fé. Contrário senso, as pessoas que são religiosas devem meter-se nos negócios do Estado, pois os negócios do Estado afetarão a vida de cada religioso. A doutrina cristã apresenta modelos de conduta e de moral, modelos que são aceitos e seguidos pela grande maioria dos brasileiros. Se vivemos numa democracia, e democracia é o governo da maioria, que as ideias e ideais dos cristãos sejam parte da discussão.

A retirada de símbolos religiosos – fala-se em símbolos religiosos, porém os símbolos cristãos é que são atacados. Caso um budista tenha em seu gabinete um Buda tamanho real, certamente ninguém se incomodaria e achariam até bonito – é apenas mais uma tentativa de suprimir qualquer menção à religião e ao cristianismo. Levado a sério a retirada de símbolos religiosos de prédios públicos ou de qualquer coisa pública, o Cristo Redentor deveria ser posto ao chão, os Cristos que guardam a entrada da maioria das cidades brasileiras seriam derrubados, a Catedral de Maringá não poderia mais fazer parte do cartão postal da cidade.

O brasileiro é religioso, crê em Deus, acredita na bíblia. Não faz sentido nenhum retirar das discussões a essência do próprio povo que discute.


3 comentários:

  1. Como você refutaria, então, a defesa de um assassino de crianças que se baseia em uma crença que exige rituais de sacrifício? Seria justa sua impunibilidade levando em conta suas legítimas crenças?

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    1. Em nenhum momento do texto eu disse que a religião tornaria a pessoa inimputável na esfera penal. Evidente que não seria justo absolver o réu apenas com base na religião dele. Uma crença que faça os seus seguidores assassinarem um criança não é algo do bem.
      A vida é o bem maior de qualquer pessoa e, no exemplo que o sr. Anônimo traz, o indivíduo deveria ser punido sem sombra de dúvida.

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  2. Marco, a religião não deve interferir nas decisões de um Estado, uma profissão ou qualquer decisão que vai afetar alguma pessoa além da própria que toma a decisão. Sabe por quê? Porque existem muitas religiões, ramificações destas e muitas delas têm dogmas, preceitos totalmente antagônicos - posso citar alguns exemplos, mas creio não ser necessário, pois você deve conhecer vários.
    Pense no seguinte exemplo: o cristão (enquanto aquele que acredita em cristo)é psiquiatra. Um paciente chega dizendo que está vendo demônios, que espíritos têm falado constantemente com ele etc. O que ele faria? Seguiria a ciência, segundo a qual esse homem está acometido por uma esquizofrenia crônica? Ou a religião dele, segundo a qual ele de fato está vendo demônios e espíritos?
    Consegue entender o impasse a que o psiquiatra chegou?


    Seu amado Pedreiro.

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